quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Transgênicos plantam dúvidas

Uma polêmica criada nos laboratórios, semeada no campo e fortificada nos meios acadêmicos está provocando acirrados debates no mundo científico. São as plantas transgênicas ou organismos geneticamente modificados (OGMs), responsáveis por uma das maiores controvérsias na ciência desde do final do milênio passado. Enquanto o produto transita solenemente pelo mercado norte-americano, a Europa assiste a tudo com ampliada desconfiança.

Já no Brasil em 2003, o Ministério da Justiça, consentiu que os transgênicos fossem comercializados legalmente. Contanto que os produtos transgênicos venham devidamente sinalizados em seu rótulo, para que o consumidor tenha liberdade de escolher consumi-los ou não. Ao mesmo tempo em que a medida arrancou aplausos de um grupo, provocou também a ira de outro. Tal como nos anos 50, quando a "revolução verde" implantou os agrotóxicos no campo, as empresas que fabricam os venenos químicos estão propondo uma outra forma de produzir. O mercado dos OGMs promete maior produtividade e, principalmente, resistência ao uso de agrotóxicos.

As críticas aos OGMs que vão desde o desequilíbrio ecológico, passam pelos perigos à saúde humana e desembocam na questão do monopólio de empresas transnacionais. O biólogo e ambientalista Nelson Medeiros adverte que a transferência de material genético humano para microorganismos inimigos potenciais da saúde do homem, pode vir a gerar microorganismos que o sistema imunológico humano tenha dificuldade de identificar e, por conseqüência, dificuldade para combater. Medeiros lembra ainda que o patenteamento dessas sementes por empresas transnacionais fere princípios éticos, além do perigo que representa meia dúzia de corporações internacionais controlarem os dois únicos setores sobre os quais o Terceiro Mundo ainda mantém um certo domínio: a agricultura e a pecuária. "É a redução definitiva da economia mundial", alerta ele. Medeiros garante ser incalculável o risco ambiental. Ele argumenta que a planta transgênica não passou pelos milhares de anos do processo de seleção natural. "Isto quer dizer que ela vai ocupar o espaço de alguma espécie, vai comer a sua comida, habitar a sua moradia, e o impacto na natureza será a conseqüência direta", informa. O ambientalista salienta que a produção de alimentos, hoje, no mundo, é de 120% da necessidade do planeta. Para ele, o problema não está na falta de produção de alimentos, mas sim na má distribuição deles.

Como Medeiros, o engenheiro agrônomo e ecologista José Lutzenberger também ataca a questão do monopólio. "Eles estão patenteando o que nunca se patenteou: os seres vivos, partes de seres vivos, processos vitais, tem até uma corrida para patentear os genes de todo o genoma humano", critica Lutzenberger. Para ele, as patentes se justificam, por tempo limitado, para invenções e não para descobertas dos mistérios da natureza. Os genes existem há mais de três bilhões de anos, os processos de transferência também. "Ninguém tem o direito de atribuir a posse da vida, de partes dela ou de processos vitais", acrescenta. O agrônomo diz que, em nome de um aumento fictício da produtividade, as transnacionais pretendem impor pacotes, como a soja Roundup Ready, uma variedade resistente ao herbicida da própria empresa fabricante. "Eles querem obrigar o agricultor a comprar uma nova semente a cada replantio e assim eliminar a possibilidade dele ter uma semente própria", e completa “A rotulagem é fundamental para que seja feito um acompanhamento do que está acontecendo. Com relação ao ambiente, depois que a gente colocar o gene na natureza, não é possível voltar atrás. Mas, se cometermos algum equívoco com relação à segurança alimentar, podemos recuar. Por isso é que, no caso dos medicamentos, é mais fácil. Quando não dá certo, podem ser retirados do mercado".

A maior cadeia britânica de cosméticos, a Body Shop, chegou a anunciar a retirada de suas estantes qualquer produto que contenha OGM, em particular aqueles à base de óleos de soja e milho. O cientista Arpad Pusztai, que trabalhou no Instituto de Pesquisa Rowett, na Escócia, anunciou no final do ano passado que batatas transgênicas alteraram o sistema imunológico e o cérebro de ratos. Autoridades britânicas e a direção do instituto, porém, consideram os estudos de Arpad ainda incompletos. Os defensores da manutenção do Brasil, como território livre dos OGMs citam experiências controversas realizadas no mundo. No Japão, a empresa Showa Denko criou bactérias transgênicas para produzir vitaminas e aminoácidos (L-triptofano). O resultado foi a morte de 35 pessoas e intoxicação em outras cinco mil. A empresa Pioneer criou uma variedade de soja transgênica com genes da castanha-do-pará, mas não pôde explorar a patente porque o produto causava alergia. Nos Estados Unidos, cientistas criaram um salmão que cresce duas vezes mais rápido do que os outros.

É exatamente contra este tipo de vinculação que os ecologistas sustentam suas críticas. A empresa consegue casar a venda de sua semente com a do veneno que ela mesma fabrica, deixando o agricultor na situação de cliente cativo. Em maio passado, por decisão unânime, os 27 secretários estaduais da Agricultura do país aprovaram uma moção que reivindica a proibição do plantio comercial no Brasil de OGMs. A decisão inédita, votada e oficializada durante o Fórum Nacional, realizado em Pernambuco, foi entregue ao ministro da Agricultura. Além das justificativas já conhecidas - como falta de pesquisas que comprovem as conseqüências maléficas ou não do consumo desses alimentos, a possibilidade de formação de monopólio e a decisão do consumidor europeu de não comprar produtos modificados -, os secretários alegaram ainda implicações extras no orçamento dos estados. Citaram como gastos futuros a certificação dos produtos e a fiscalização nas divisas entre as lavouras transgênicas e as convencionais.

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